Interrogatório de Bolsonaro: veja os principais pontos da fala do ex-presidente no STF

Ex-presidente disse que não houve plano de golpe

Bolsonaro durante interrogatório na 1ª Turma do STF sobre trama golpista — Foto: Ton Molina/STF

O Supremo Tribunal Federal (STF) retomou, na tarde desta terça-feira, 10 de junho, o interrogatório dos réus do ‘núcleo crucial’ na ação penal que apura a tentativa de golpe de Estado em 2022.

O ex-presidente Jair Bolsonaro é o sexto a ser ouvido. Ele é apontado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) como peça-chave da organização criminosa que atuou pela ruptura democrática.

Bolsonaro pede desculpa a Moraes e diz não ter indícios de denúncia contra ministros

Ao ser questionado por Alexandre de Moraes sobre denúncia feita por ele de que os ministros estariam levando dinheiro nas eleições, Bolsonaro pediu desculpas a Moraes e afirmou não ter indícios.

“Quais eram os indícios que o senhor tinha que nós estaríamos levando U$S 50 milhões, U$S 30 milhões?”, perguntou Moraes.

Não tem indícios nenhum, senhor ministro. Tanto é que era uma reunião para não ser gravada. Um desabafo, uma retórica que eu usei. Se fosse outros três ocupando teria falado a mesma coisa. Então, me desculpe, não tinha qualquer intenção de acusar de qualquer desvio de conduta os senhores três”, respondeu Bolsonaro.

‘Não achei nada’

Ao chegar no plenário da Primeira Turma para acompanhar as audiências nesta manhã, Bolsonaro afirmou que poderia “falar por horas” durante seu interrogatório se “puder ficar à vontade”.

Uma hora antes do interrogatório de Bolsonaro, Moraes negou pedido da defesa do ex-presidente para exibir vídeos durante seu interrogatório sobre a suposta trama golpista. Segundo o ministro, os advogados podem juntar os vídeos no processo.

Em resposta, ao chegar na sessão nesta tarde, Bolsonaro afirmou: “Não achei nada”.

Nesta segunda-feira (9), foram ouvidos o ex-ajudante de ordens Mauro Cid e o deputado federal Alexandre Ramagem.

Na sessão desta terça de manhã, os interrogados foram o almirante Almir Garnier, ex-comandante da Marinha, o ex-ministro da Justiça, Anderson Torres, e o ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional general Augusto Heleno.

Em que fase está o julgamento?

Os depoimentos marcam a reta final da instrução processual — fase em que são reunidas provas para embasar o julgamento. É nesse momento que os réus têm a chance de responder às acusações e apresentar suas versões dos fatos.

Divulgação

Segundo a Procuradoria-Geral da República (PGR), o grupo integra o “núcleo crucial” da organização criminosa que atuou para tentar romper a ordem democrática. Entre os réus está o ex-presidente Jair Bolsonaro.

Concluída a fase de interrogatórios, o processo segue para uma etapa de diligências, caso sejam solicitadas por defesa ou acusação. Depois, será aberto o prazo de 15 dias para apresentação das alegações finais, antes de o caso ser levado a julgamento na Primeira Turma do STF.

Os réus do núcleo crucial são:

  1. Mauro Cid
  2. Alexandre Ramagem;
  3. Almir Garnier;
  4. Anderson Torres;
  5. Augusto Heleno;
  6. Jair Bolsonaro;
  7. Paulo Sérgio Nogueira;
  8. Walter Braga Netto.

A PGR atribuiu ao grupo cinco crimes:

➡️abolição violenta do Estado Democrático de Direito: pune o ato de “tentar, com emprego de violência ou grave ameaça, abolir o Estado Democrático de Direito, impedindo ou restringindo o exercício dos poderes constitucionais”. A pena varia de 4 a 8 anos de prisão.

➡️golpe de Estado: fica configurado quando uma pessoa tenta “depor, por meio de violência ou grave ameaça, o governo legitimamente constituído”. A punição é aplicada por prisão, no período de 4 a 12 anos.

➡️organização criminosa: quando quatro ou mais pessoas se reúnem, de forma ordenada e com divisão de tarefas, para cometer crimes. Pena de 3 a 8 anos.

➡️dano qualificado: destruir, inutilizar ou deteriorar coisa alheia, com violência e grave ameaça, contra o patrimônio da União, e com considerável prejuízo para a vítima. Pena de seis meses a três anos.

➡️deterioração de patrimônio tombado: destruir, inutilizar ou deteriorar bem especialmente protegido por lei, ato administrativo ou decisão judicial. Pena de um a três anos.

Durante o interrogatório, conduzido pelo ministro Alexandre de Moraes, Bolsonaro negou envolvimento em uma trama golpista, minimizou as reuniões com militares e admitiu que pode ter exagerado na retórica.

Veja os principais pontos abaixo:

1. Negativa de golpe e de ameaças

Bolsonaro negou que tenha havido qualquer plano para um golpe de Estado.

Afirmou que, em “nenhum momento”, alguém o ameaçou de prisão, e que as Forças Armadas não aceitariam cumprir ordens ilegais.

Em seu depoimento, o brigadeiro Baptista Jr., ex-comandante da Aeronáutica, afirmou que, em reunião com os comandantes das Forças, no fim de 2022, Bolsonaro discutiu ruptura democrática. E que teria ouvido do general Freire Gomes, então comandantes do Exército, que teria que prender o então presidente se a ideia fosse adiante.

Bolsonaro negou a existência dessa conversa.

“As Forças Armadas têm missão legal. Missão ilegal não é cumprida. Em nenhum momento alguém me ameaçou de prisão.”

2. Admissão de conversas sobre alternativas ‘constitucionais’

O ex-presidente disse que houve reuniões com militares para discutir possíveis saídas dentro da legalidade, após a rejeição de uma petição do PL ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) questionando a segurança das urnas.

“As conversas eram bastante informais. Era conversa informal para ver se existia alguma hipótese de um dispositivo constitucional para a gente atingir o objetivo que não foi atingido no TSE. Isso foi descartado na segunda reunião.”

3. ‘Não tinha clima’ para golpe

Bolsonaro afirmou que não havia qualquer viabilidade para um golpe e que o ambiente político era de desmobilização.

“Não tinha clima, não tinha base minimamente sólida para fazer coisa.”

4. Defesa do voto impresso e críticas às urnas

O ex-presidente voltou a criticar o sistema eletrônico de votação, defendendo modelos adotados em países como Venezuela e Paraguai e afirmando que o sistema brasileiro é “inauditável”.

“No Paraguai, no meu entender, é o ideal. Como passou a existir nas últimas eleições até na Venezuela. Nós não podemos esperar que aconteça isso no Brasil para tomar uma providência.”

5. Desculpas a Alexandre de Moraes

Questionado sobre insinuações feitas no passado de que ministros estariam recebendo propina durante as eleições, Bolsonaro pediu desculpas a Moraes e disse que se tratava de um “desabafo” sem provas.

“Não tem indícios nenhum, senhor ministro. Me desculpe, não tinha qualquer intenção de acusar de qualquer desvio de conduta os senhores três.”

6. Minuta do golpe

Bolsonaro disse que não tem qualquer responsabilidade sobre a chamada “minuta do golpe” – documento encontrado com o ex-ministro da Justiça Anderson Torres que previa uma intervenção no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e a permanência de Bolsonaro no poder, mesmo após a derrota nas urnas.

Segundo Bolsonaro, o texto foi apresentado de maneira superficial em uma televisão durante uma reunião, sem qualquer discussão aprofundada sobre o conteúdo.

“Foi colocado numa tela na televisão e mostrado de forma rápida ali”, disse.

“Tinha os ‘considerandos’ ali apenas. Não tinha cabeçalho, nem o ‘fecho’. Só isso.”

O ex-presidente negou qualquer envolvimento na redação ou alteração do documento:

“Não escrevi, não alterei, não digitei nada. Não tenho responsabilidade sobre essa minuta.”

E reforçou que a proposta foi imediatamente descartada:

“Não se discutiu nada além disso. Foi abandonada qualquer possibilidade de ação constitucional.”

A versão de Bolsonaro contradiz o que disse Mauro Cid, seu ex-ajudante de ordens e delator no processo. No depoimento dado ao STF, Cid afirmou que o então presidente não apenas teve acesso à minuta, mas também sugeriu alterações. Segundo Cid, Bolsonaro teria retirado nomes de diversas autoridades listadas para prisão e deixado apenas o nome do ministro Alexandre de Moraes.

7. Isolamento e conversas com militares

Bolsonaro relatou que, após perder a eleição, viveu um “vazio” e procurou generais para conversas amigáveis.

“Conversei sim com militares, de forma isolada, para trocar informações sobre a conjuntura, porque quando você perde uma eleição, é um vazio que o senhor não imagina. Esse vazio muitas vezes era preenchido com visita e conversa amigável entre eu e alguns oficiais generais das Forças Armadas.”

8. Quem pede AI-5 é maluco

Bolsonaro afirmou que não estimulou manifestações ilegais e classificou como “malucos” os que pedem um novo AI-5 ou uma intervenção militar.

“Tem os malucos que ficam com essa ideia de AI-5, de intervenção militar das Forças Armadas… que os chefes das Forças Armadas jamais iam embarcar nessa só porque o pessoal estava pedindo ali”, afirmou o ex-presidente.

O AI-5 (Ato Institucional nº 5), de 1968, é considerado o decreto mais autoritário da ditadura militar (1964-1985), responsável pelo fechamento do Congresso Nacional, suspensão de garantias constitucionais e intensificação da repressão política.

Durante o interrogatório, Bolsonaro disse que, antes de viajar para os Estados Unidos, gravou uma live pedindo paz e reafirmou que não teve participação nos atos de 8 de janeiro. Ele também mencionou ter publicado vídeo pedindo a desobstrução de rodovias após os bloqueios feitos por apoiadores que não aceitaram o resultado das eleições.

“Se eu almejasse um caos no Brasil, era só ficar quieto”, afirmou.

Ao ser questionado pelo procurador-geral da República, Paulo Gonet, se não teria atuado para desmobilizar os acampamentos em frente a quartéis, Bolsonaro disse que o ato de intervir nos protestos poderia ser ainda mais arriscado.

“Alguns poucos falavam até em AI-5. Quantas vezes eu orientava o pessoal que chegava, em movimentos nossos pelo Brasil, eu chegava para quem estava com a placa do AI-5. Questionava: ‘O que é AI-5?’. Eles nem sabiam o que era isso. Intervenção militar, isso não existe. É pedir pro senhor praticar o suicídio, isso não existe. Deixa o pessoal desabafar”.

Fonte g1 / UOL / Folha de São Paulo







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